sexta-feira, maio 20, 2005

 

A surpresa

Não criamos riqueza suficiente para sustentar o actual modelo social, tal como está estruturado.
Não deveria haver surpresa quanto à gravidade da situação do País, nomeadamente quanto à degradação das contas do Estado, e à necessidade de serem tomadas urgentemente medidas profundas.

Já há muito se percebeu que a forma como a Sociedade Portuguesa funciona e está organizada não permite alcançar os respectivos objectivos últimos, que passam por um maior desenvolvimento económico e, principalmente, por uma maior felicidade e realização pessoal dos cidadãos.

Acresce que não criamos riqueza suficiente para sustentar o actual modelo social, tal como está estruturado, sendo insustentável a progressão da despesa pública e incomportável a ineficiência e o peso do Estado.

Ainda recentemente, na apreciação dos programas eleitorais de Governo, diversas vozes e alguns movimentos da Sociedade Civil salientaram que a gravidade da situação não estava a ser totalmente explicitada, nem assumidas as medidas necessárias para a corrigir.

Tem que se redefinir o papel do Estado no sentido de este passar a ser, essencialmente, um garante da igualdade de oportunidades, da prestação de serviços públicos de qualidade e a entidade que define as regras do jogo – fiscalizando, regulando e administrando eficazmente a Justiça.

O Estado tem, ainda, de combater com determinação a pobreza, ao mesmo tempo que coordena a atribuição das diversas prestações sociais por forma a lhes dar consistência e evitar sobreposições, fraudes ou desincentivos ao trabalho e à iniciativa por parte dos cidadãos.

Reafirma-se, assim, a necessidade de se tomarem imediatamente medidas estruturantes relacionadas directamente com o Estado e com a despesa pública, que passam por:
• Estabelecer um novo processo de planeamento plurianual do Estado, assente numa gestão por objectivos com responsáveis claros, normas contabilísticas estáveis e transparentes, publicamente reportadas e auditadas por comissão independente – planeamento esse que fixe um objectivo a médio prazo para a despesa pública face ao PIB (próximo dos 40%) explicitando as áreas e as formas da sua redução.

• Criar comissões independentes para avaliação dos principais investimentos públicos, cujos pressupostos mais importantes e fundamentos de decisão deverão ficar registados e passíveis de ser publicamente consultados.

• Criar um corpo de quadros de topo da Administração Pública profissionalizados, devidamente recrutados e seleccionados, com a formação adequada, com remuneração competitiva face ao mercado de trabalho, incluindo bónus variáveis pelo cumprimento de objectivos.

• Estabelecer processos de avaliação para os principais serviços públicos, conduzidos por comissões independentes que permitam estabelecer e acompanhar indicadores de desempenho, qualidade e eficiência, promovendo a competitividade interna e externa.

• Desenvolver um programa estruturado de redução dos custos do pessoal da Administração Pública (nomeadamente face ao PIB), a partir de uma avaliação das necessidades de efectivos futuros, promovendo a integração de excedentários na Sociedade, através de apoios específicos à formação e à sua colocação em novas oportunidades profissionais – para além da concessão de uma indemnização que permita alcançar uma rescisão por mútuo acordo. Aumentos salariais na Função Pública nos próximos 3 anos, em princípio, só seriam concedidos sob a forma de prémios variáveis relacionados com o cumprimento de objectivos, tais como a redução de custos (eliminar-se-iam os aumentos/promoções automáticas).

• Reestruturar a Segurança Social, aumentando a idade da reforma e/ou mantendo essa idade, mas atribuindo menos benefícios. Igualar o esquema da Caixa Geral de Pensões ao Regime Geral.

No que diz respeito a decisões sobre impostos, as mesmas deverão ser enquadradas numa estratégia e planeamento integrado para angariação de receitas do Estado, explicitando o peso das várias componentes: sistema fiscal (e qual), pagamento de serviços públicos (quais e como) e outras receitas (privatizações etc).

Qualquer aumento de impostos, neste momento, deverá sempre ser considerado como excepcional e temporário e só admissível se existir em paralelo um compromisso, sustentado num planeamento adequado, quanto à redução da despesa pública. Esta redução deverá ser, aliás, compatível com o aumento da qualidade dos serviços públicos e permitirá, posteriormente, diminuir de modo significativo a carga fiscal.

António Carrapatoso

www.diarioeconomico.com

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