terça-feira, julho 12, 2005

 

A SOLUÇÃO É O CELIBATO

Todos sabemos, por experiência própria, que a competência e a disponibilidade nada têm a ver com a exclusividade. Pelo contrário, quem pouco faz é, regra geral, quem tem menos tempo disponível. Daí a razão do provérbio chinês: «quando tiveres de pedir um favor a alguém, pede a uma pessoa que tenha muito que fazer».

Por outro lado, o facto de um indivíduo passar de aluno a professor sem nunca ter trabalhado ou desenvolvido qualquer actividade profissional fora da escola é uma das principais pechas do nosso sistema de ensino e a principal causa do grande desfasamento entre a escola e a vida activa.

Apesar disso, a nossa Ministra da Educação parece firmemente decidida a acabar, no ensino público, com o regime de acumulações. Os professores andavam mal habituados, de barriguinha cheia... É certo que um professor não ganha o mesmo que um médico... Mas isso que importa? O dinheiro não traz a felicidade.

Além disso, isto de ser professor também não é para ganhar dinheiro. O ensino não é uma profissão, é um sacerdócio ou, quanto muito, uma ocupação de mulheres bem casadas (entendendo-se por bem casadas, obviamente, mulheres com um marido rico). Com efeito, um verdadeiro professor é aquele que abraça a profissão com espírito de missionário e que, apenas, espera encontrar a recompensa do seu trabalho na outra vida. Acresce que, se o professor tiver mesmo falta de dinheiro, nada o impede que faça, tal como os sacerdotes durante a homilia, um peditório na turma, ficando o delegado de turma (sugiro mesmo que se passe a chamar «o sacristão da turma») com a incumbência de fazer circular a bandeja por entre as carteiras, enquanto o professor dita o sumário.

Mas eu bem sei, irmãos, que há entre nós muitos professores que não encaram a profissão com o mesmo espírito com que nós a encaramos e como deve ser encarada. Também eu, irmãos, conheço muitos professores que gostam de andar de automóvel, que não querem viver uma vida inteira fechados num quarto e a comer meias doses nos restaurantes, que querem que os seus filhos vão estudar para a universidade e que gostam de passar férias na praia e até no estrangeiro...

Ora, é evidente que, para se ter casa, carro, almoçar e jantar convenientemente, ter os filhos a estudar na universidade e passar férias na praia ou no estrangeiro, não é com os mil euros por mês que se ganha no ensino. É lógico que, para suportar todos estes luxos, os professores têm de procurar outras fontes de rendimento: explicações, comércio, agricultura, política, advocacia, jornalismo, dar pareceres, dar aulas noutros estabelecimentos, etc. etc.

Está visto, irmãos, que a solução não está na exclusividade, tanto mais que ninguém acredita que os peditórios na turma dêem um grande acrescento ao fraco pecúlio dos professores. Na verdade, com os salários que os professores auferem, a maioria não tinha outra alternativa, para manter o seu nível de vida, senão manter os seus “ganha-pão”, mais que não fosse, por interposta pessoa, o que fazia com que a situação ainda ficasse pior, na medida em que ficava menos transparente.

O segredo, irmãos, não é, pois, a exclusividade, mas o celibato. Porque se os professores não se casassem, nem tivessem filhos, o seu salário chegava-lhes e sobejava-lhes para poderem levar uma vida digna (sem luxos, é verdade) e sem necessidade de sacrificar os seus tempos livres para ganhar mais uns tostões.





Santana-Maia Leonardo, in Primeira Linha

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