sexta-feira, agosto 26, 2005

 

SE CONDUZIR NÃO BEBA POUCO

Como todos reconhecemos, condução e álcool formam um coquetel altamente explosivo. Por essa razão, decidiu o Governo, recentemente, agravar substancialmente o valor das coimas relativas à condução sob a influência do álcool, por forma a dissuadir os nossos condutores de se meterem nos copos antes de pegarem no carro.

Assim, quem for hoje apanhado com uma taxa de alcoolémia superior 0,8 gr/l e inferior a 1,2 gr/l tem garantida uma coima de, pelo menos, 500 euros e que pode ir até aos 2.500 euros (artigo 81º/5-b do CE). A partir de 1.2 gr/l, a condução sobre a influência do álcool deixa de ser contra-ordenação e passa a ser crime.

Mas não se assuste, caríssimo leitor. Não se esqueça que estamos em Portugal. Parecia-lhe, assim à primeira vista, que, sendo crime, a pena seria mais grave, não era?... Isso seria assim se vivêssemos num país de gente inteligente, sensata e que se guiasse por raciocínios lógicos. Só que, infelizmente, não vivemos.

Assim, o normal neste país é um indivíduo com uma taxa de alcoolémia superior a 1,2 gr/l ser condenado a pagar uma multa bastante inferior àquela que pagaria se fosse apanhado apenas com 0,8 gr/l. Ou seja, enquanto um indivíduo com uma taxa de 0,8 gr/l tem de pagar, pelo menos, 500 euros de multa e pode chegar até aos 2.500 euros, um indivíduo com uma taxa de 1,87, 2,40 ou 2,80 gr/l pode pagar apenas 300 euros, bastando-lhe, para tal, fazer a choradeira do costume de que ganha pouco e tem muitos encargos.

Já sei o que está a pensar. Afinal, o senhor não ganha tão pouco como isso, não é? Só que o senhor pensa que alguém vai ver o que ganha? Vê-se mesmo que não conhece o país onde vive. Não, caríssimo leitor, o tribunal confia na sua palavra. Você até é um homem sério...

Agora, dou-lhe um conselho: livre-se de levar ao tribunal alguma testemunha abonatória. Aí é que você corre um risco de morte. A título de exemplo vou-lhe contar um caso que tive a sorte de presenciar.

Um indivíduo foi responder por ter sido apanhado com uma taxa de alcoolémia de 2,80 gr/l. Confessou os factos e alegou ser um condutor prudente, tendo sido a primeira vez que tinha conduzido embriagado, só o tendo feito por manifesta necessidade. E, para atestar isso mesmo, fez questão que fosse ouvido o seu patrão.

«Então, diga lá, este senhor é seu empregado, não é?» perguntou a juiz. «É, sim senhora doutora juiz», respondeu o patrão. «Este senhor é a primeira vez que conduz embriagado?» «A primeira vez?», indignou-se o patrão. «Já três ou quatro vezes que lá me aparece a cheirar a álcool... E eu já lhe disse: a próxima vez que o apanhar a conduzir bêbado, despeço-o logo». O meu colega ficou branco como a cal da parede. Maldita a hora em que apresentou a testemunha.

A juiz manda o patrão sentar-se lá atrás e começa a interrogar o arguido sobre a sua situação económica. «Então o senhor quanto é que ganha?» «Ganho o ordenado mínimo nacional», respondeu o arguido. «O ordenado mínimo?» diz em voz alta o patrão lá do fundo da sala. «Mas ca granda mentiroso....»

Por isso, caríssimo leitor, se gosta de beber uma cervejinha antes de conduzir, não se esqueça de trazer sempre no carro uma garrafa de aguardente, não vá o diabo tecê-las. Com menos de 1,2 gr/l é que não convém nada ser apanhado. Ah, e não se esqueça também: nada de testemunhas abonatórias. A sua palavra basta. Até pode dizer, como eu também já ouvi recentemente, que é pedreiro, ganha cerca de 50 contos por mês e paga 60 contos de renda de casa, que ninguém estranha.

Mas, sobretudo, nunca se esqueça de que vivemos em Portugal, o que significa que também não se deve admirar se as contas lhe saírem furadas.





Santana-Maia Leonardo, in Primeira Linha

Comments:
Rapazes

Então a lista do PPD/PSD às eleições de 9 de Outubro de 2005, ainda não foram divulgadas por vós, o que se passa?
 
Bom post.
 
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