terça-feira, junho 20, 2006
OS MAUS E OS BONS DA FITA
(Os maus são obviamente os professores)
Na sua cruzada contra os professores, chegou agora a vez da ministra da Educação exibir como exemplo a seguir a classe profissional dos médicos, na medida em que, ao contrário dos professores, dão prioridade aos doentes que estão em perigo de vida.
Ora, ao contrário do apregoado pela ministra, há mais de vinte anos que os professores não se preocupam com outra coisa a não ser com os alunos com mais dificuldades. E se os médicos conseguem prolongar a vida, artificialmente, a muitos doentes que, em condições normais, já teriam morrido, os professores, nesse aspecto, também têm conseguido prolongar, artificialmente, o grau de escolaridade de muitos jovens (alguns até à universidade) que, em condições normais, nunca teriam passado sequer da 4ª classe.
É certo que, mesmo assim, ainda há muitos que morrem pelo caminho. Mas isso também ainda sucede com muitos doentes. Com efeito, por muita dedicação que tenha o médico, isso ainda não é suficiente para impedir que continuem a morrer pessoas em Portugal (se estiver errado, agradecia que me corrigisse, senhora ministra).
Quanto ao facto de o insucesso e o abandono escolar serem superiores à mortalidade nos nossos hospitais, o único culpado por que isso sucede é o Ministério da Educação que não permite que os professores utilizem, nas suas aulas, os mesmos métodos que os médicos utilizam nos hospitais para tratarem os doentes que se recusam a tomar a medicação, que querem arrancar os tubos que têm ligados ao corpo ou que se querem suicidar. Se os professores também pudessem chamar dois enfermeiros para agarrarem os alunos que perturbam as aulas, amarrá-los à carteira e amordaçá-los, não só o abandono escolar como também o insucesso escolar desceriam em flecha.
O problema é que os professores estão impossibilitados, na maioria das turmas, de dar uma aula com um mínimo de seguimento e coerência porque há sempre, mesmo nas melhores turmas (nas piores é a turma inteira), dois ou três alunos insolentes, que se comprazem em perturbar o bom funcionamento da aula. E, nestes casos, as escolas funcionam ao contrário dos hospitais. Com efeito, quando os alunos se comportam mal, quem fica de mãos e pés atados são os professores e não os alunos.
É, por isso, intelectualmente desonesto acusar os professores pelo insucesso escolar quando é o próprio Ministério que lhes cria as condições objectivas para que não consigam o sucesso. E só por cinismo se pode dar como exemplo o ensino privado quando se sabe perfeitamente que o sucesso alcançado nas escolas privadas é fruto da eliminação pura e simples de todo e qualquer aluno que se comporte mal ou que perturbe as aulas.
É, pois, absolutamente natural que, no ensino público, os professores mais velhos e com mais anos de serviço (o que não significa, obviamente, que sejam os melhores) fiquem com as turmas mais sossegadas e os professores mais novos com as turmas mais difíceis. E é assim que deve ser, por uma razão bem fácil de perceber: as turmas mais indisciplinadas não necessitam de um professor que tenha muitos conhecimentos, mas de um ranger, ou seja, de indivíduos com grande resistência física e psicológica, para aguentarem, no mínimo, durante noventa minutos muito ruído, muitos desaforos, muitas ofensas e muitos comportamentos insolentes. Para dar aulas a certas turmas, os professores não necessitam de ter grandes conhecimentos, basta que tenham resistência física e psicológica e formação militar.
Se colocassem à frente destas turmas uma professora do género da senhora ministra da Educação, essa professora dificilmente conseguiria terminar o ano sem entrar em depressão, a não ser que faltasse sistematicamente a essas aulas para tentar preservar a sua saúde física e mental.
E a senhora ministra da Educação sabe isto perfeitamente, pelo que, ao querer forçar os conselhos directivos a distribuírem as piores turmas aos professores mais velhos, só pode ter um objectivo: expulsar do ensino os professores mais velhos (que já não têm estrutura física e psicológica para aguentar a indisciplina de certas turmas), promovendo, dessa forma enviesada, a renovação da classe docente que o aumento da idade da reforma veio dificultar.
Deviam, de resto, ser colocadas câmaras ocultas em todas as salas de aulas para que o país pudesse compreender não só a razão por que os professores não podem ter mais horas lectivas, sob pena de arruinarem definitivamente a sua saúde física e mental, como também que os professores, afinal, são as principais vítimas de um sistema criado para gerar iniquidade.
Santana-Maia Leonardo, in Primeira Linha
Na sua cruzada contra os professores, chegou agora a vez da ministra da Educação exibir como exemplo a seguir a classe profissional dos médicos, na medida em que, ao contrário dos professores, dão prioridade aos doentes que estão em perigo de vida.
Ora, ao contrário do apregoado pela ministra, há mais de vinte anos que os professores não se preocupam com outra coisa a não ser com os alunos com mais dificuldades. E se os médicos conseguem prolongar a vida, artificialmente, a muitos doentes que, em condições normais, já teriam morrido, os professores, nesse aspecto, também têm conseguido prolongar, artificialmente, o grau de escolaridade de muitos jovens (alguns até à universidade) que, em condições normais, nunca teriam passado sequer da 4ª classe.
É certo que, mesmo assim, ainda há muitos que morrem pelo caminho. Mas isso também ainda sucede com muitos doentes. Com efeito, por muita dedicação que tenha o médico, isso ainda não é suficiente para impedir que continuem a morrer pessoas em Portugal (se estiver errado, agradecia que me corrigisse, senhora ministra).
Quanto ao facto de o insucesso e o abandono escolar serem superiores à mortalidade nos nossos hospitais, o único culpado por que isso sucede é o Ministério da Educação que não permite que os professores utilizem, nas suas aulas, os mesmos métodos que os médicos utilizam nos hospitais para tratarem os doentes que se recusam a tomar a medicação, que querem arrancar os tubos que têm ligados ao corpo ou que se querem suicidar. Se os professores também pudessem chamar dois enfermeiros para agarrarem os alunos que perturbam as aulas, amarrá-los à carteira e amordaçá-los, não só o abandono escolar como também o insucesso escolar desceriam em flecha.
O problema é que os professores estão impossibilitados, na maioria das turmas, de dar uma aula com um mínimo de seguimento e coerência porque há sempre, mesmo nas melhores turmas (nas piores é a turma inteira), dois ou três alunos insolentes, que se comprazem em perturbar o bom funcionamento da aula. E, nestes casos, as escolas funcionam ao contrário dos hospitais. Com efeito, quando os alunos se comportam mal, quem fica de mãos e pés atados são os professores e não os alunos.
É, por isso, intelectualmente desonesto acusar os professores pelo insucesso escolar quando é o próprio Ministério que lhes cria as condições objectivas para que não consigam o sucesso. E só por cinismo se pode dar como exemplo o ensino privado quando se sabe perfeitamente que o sucesso alcançado nas escolas privadas é fruto da eliminação pura e simples de todo e qualquer aluno que se comporte mal ou que perturbe as aulas.
É, pois, absolutamente natural que, no ensino público, os professores mais velhos e com mais anos de serviço (o que não significa, obviamente, que sejam os melhores) fiquem com as turmas mais sossegadas e os professores mais novos com as turmas mais difíceis. E é assim que deve ser, por uma razão bem fácil de perceber: as turmas mais indisciplinadas não necessitam de um professor que tenha muitos conhecimentos, mas de um ranger, ou seja, de indivíduos com grande resistência física e psicológica, para aguentarem, no mínimo, durante noventa minutos muito ruído, muitos desaforos, muitas ofensas e muitos comportamentos insolentes. Para dar aulas a certas turmas, os professores não necessitam de ter grandes conhecimentos, basta que tenham resistência física e psicológica e formação militar.
Se colocassem à frente destas turmas uma professora do género da senhora ministra da Educação, essa professora dificilmente conseguiria terminar o ano sem entrar em depressão, a não ser que faltasse sistematicamente a essas aulas para tentar preservar a sua saúde física e mental.
E a senhora ministra da Educação sabe isto perfeitamente, pelo que, ao querer forçar os conselhos directivos a distribuírem as piores turmas aos professores mais velhos, só pode ter um objectivo: expulsar do ensino os professores mais velhos (que já não têm estrutura física e psicológica para aguentar a indisciplina de certas turmas), promovendo, dessa forma enviesada, a renovação da classe docente que o aumento da idade da reforma veio dificultar.
Deviam, de resto, ser colocadas câmaras ocultas em todas as salas de aulas para que o país pudesse compreender não só a razão por que os professores não podem ter mais horas lectivas, sob pena de arruinarem definitivamente a sua saúde física e mental, como também que os professores, afinal, são as principais vítimas de um sistema criado para gerar iniquidade.
Santana-Maia Leonardo, in Primeira Linha